História
Você sabia que sonhos como produzir carros nacionais ou modelos elétricos já existiram no Brasil? Mais do que isso, não foram sonhos, mas realidade.
O sobrenome dessa história é Gurgel. Ao longo desse post, vamos relembrar os passos desse empreendedor e visionário brasileiro, que ousou sonhar e fazer!
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[Vários modelos da marca, que vamos falar mais a seguir. Imagem: Pinterest | Reprodução] |
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JOÃO DO AMARAL GURGEL
Em 1926, João Augusto Conrado do Amaral Gurgel nascia. No começo da vida adulta, cursou Engenharia na Escola Politécnica da USP.
Como Trabalho de Conclusão de Curso, queria projetar um pequeno automóvel popular com dois cilindros, o "Tião". Seu orientador não via com bons olhos e achava que carro não se fabricava, se comprava. Para conseguir o grau de bacharel, projetou um guindaste a contragosto, e ficou com a ideia do carro na cabeça.
PÓS-GRADUAÇÃO NOS EUA
Depois de se tornar bacharel, João Augusto foi fazer uma pós-graduação nos EUA. Nesse período, trabalhou na General Motors e na Buick and Coach Corporation. Esse período fez com que aprendesse muito sobre a indústria automotiva.
A VOLTA AO BRASIL
Já em 1958, João Augusto decidiu fundar uma empresa, a Moplast Moldagem de Plásticos. Essa indústria passou a fornecer produtos para a indústria de autopeças, incluindo carrocerias em fibra-de-vidro.
Outra atividade que fez em paralelo foi produzir karts e minicarros para crianças. O sonho de lançar uma marca de automóveis 100 % brasileira seguia vivo.
A FUNDAÇÃO DA GURGEL
João Augusto criou a Gurgel Motores S/A em 1° de setembro de 1969. De sua fábrica, o primeiro modelo lançado foi o Ipanema, uma espécie de buggy off-road com carroceria mista em plástico e fibra-de-vidro. Ele tinha capota de lona e motor Volkswagen.
No começo dos anos 1970, veio um novo modelo, o Xavante XT. Depois receberia outros nomes, como X-10, X-12 e Tocantins (1988).
O chassi do Xavante XT era de plástico e aço tubular, patenteado pela Gurgel como Plasteel. A cabine, como vários modelos da marca, era em fibra-de-vidro.
Outra inovação estava no sistema Selectration. Ele havia sido criado por João Augusto para bloquear a tração de uma das rodas quando ela estivesse sem atrito com o solo, patinando.
O Selectration e outros diferenciais fizeram o Xavante se tornar o queridinho do Exército Brasileiro e Polícias/Brigadas Militares. Uma versão militar surgiu, além da versão civil. Com as mudanças de nome, o Xavante perdurou quase até o fim da Gurgel.
NOVA FÁBRICA E MAIS INOVAÇÕES
Em 1975, a Gurgel cresceu e para a expansão se efetivar, mudou para outra fábrica, de São Paulo (capital) para Rio Claro-SP. Já nessa nova fábrica, em 1976, veio o Gurgel X12-TR, com teto rígido e chassi Plasteel. A garantia era de 100.000 km rodados.
O Salão do Automóvel de Genebra teve toda a linha de veículos da Gurgel sendo apresentada, na edição de 1979. Esse ano também foi marcado pelo lançamento da picape cabine dupla X-15 e da picape cabine simples X-20.
Já havia dez modelos na Gurgel. Eles eram movidos a gasolina ou a etanol. Hoje vemos, além do etanol, o biodiesel, mas esse tipo de solução, apesar do aspecto de vanguarda, não enchia os olhos de João Augusto.
Ele achava que era melhor “usar as terras para o plantio de alimentos do que para alimentar veículos”. É uma visão, de certo modo, peculiar, pois a ideia de usar fontes renováveis representa uma visão de futuro.
Entretanto, outra fonte renovável chamava a atenção de João Augusto. Ele queria fabricar veículos elétricos. Com isso, inaugurou outra fábrica, especialmente para produzir veículos elétricos, em 1980.
O primeiro Gurgel elétrico foi o Itaipu E150, homenagem à hidrelétrica binacional. Em 1981 veio o Itaipú E400.
A autonomia não era grande, infelizmente. O limite era de 80 km. A massa elevada, grande tempo para recarga e custo das baterias também pesaram para descontinuar os modelos. Os veículos acabaram sendo bastante usados por estatais de eletricidade, enquanto vendidos.
A cabine do Itaipú E150 e do E400 foi usada em novos modelos. Em 1982, o Gurgel G800, além dessa cabine, tinha mecânica Volkswagen a ar, movido a gasolina ou etanol. Outro modelo lançado foi um XEF, minicarro com dois assentos e inspirado nos modelos Mercedes Benz.
Em 1984, o maior e mais tecnológico utilitário foi lançado: o Carajás. Ele tinha motor e embreagem na frente, caixa de marchas e diferencial juntos na traseira, onde estava a tração. O motor era Volkswagen, AP 1.8, usado também no Santana, com arrefecimento à água. Também foi lançada uma versão diesel, com motor da Kombi. Eram configurações bem inovadoras para a época.
Já em sete de setembro de 1987 – uma data simbólica e pensada dentro de um contexto – o Carro Econômico Nacional (CENA) foi lançado. A leitura é similar à do sobrenome Senna, o que levou a um conflito com a família do piloto.
Era genuinamente brasileiro e tinha peças 100 % nacionais. O mercado era dominado por marcas estrangeiras, e ele representava uma independência disso.
O veículo misturava aço, plástico e fibra-de-vidro. Tinha motor de dois cilindros de 650 ou 800 cm³ com arrefecimento à água. Era leve, pequeno e bem ágil.
De 1988 a 1991, passou a ser chamado de BR-800. Após melhorias, ganhou o nome de Supermini. Também derivado do BR-800, o Motomachine tinha dois lugares e portas translúcidas, com um conceito mais inovador.
Visando não apenas vender, mas capitalizar a fábrica, a Gurgel entregava o modelo após a compra de ações da empresa. A campanha era incisiva e chamava o comprador pelo anúncio: “se Henry Ford o convidasse para ser seu sócio, você não aceitaria?"
DERROCADA
No governo Collor, em 1991, houve uma redução de IPI para veículos com motores abaixo de mil cilindradas. Isso fez com que veículos de montadoras estrangeiras ficassem mais competitivos frente ao BR-800 e fez a Gurgel perder mercado. Outra medida impactante foi a importação de automóveis estrangeiros ser permitida, introduzindo novos modelos.
Houve, ainda, uma greve de agentes da Receita Federal. Alguns componentes importados da linha de montagem tiveram atraso de importação por causa disso, fazendo cair a produção no biênio 1991-1992 e também gerando um rombo nas finanças da empresa.
Em 1993, a Gurgel Motores S/A entrou em concordata. Em 1994, foi decretada a falência, após João Augusto não conseguir um empréstimo. A empresa recorreu e ainda manteve a produção até 1996. Foram quarenta mil carros vendidos ao longo de todos esses anos.
ÚLTIMOS ANOS E LEGADO
João Augusto Conrado do Amaral Gurgel passou a levar a vida como palestrante. Sonho, persistência e criatividade são parte do legado dele, e que certamente trouxe ótimas palestras para novas gerações.
Em 2009, João Augusto faleceu. Ele tinha mal de Alzheimer. Pereceu um homem, ficou uma história.
Além da vida criativa e do sonho, é muito interessante ver marcos como a busca por elementos de identidade e força nacional. Isso aconteceu inclusive na escolha de nomes que remetiam a elementos da cultura brasileira, como Xavante, Ipanema, Itaipu, Carajás e Tocantins. O CENA foi um marco forte também.
Outra ideia visionária foi a eletrificação, hoje vista como tendência forte na indústria automobilística. Pena que naquela época ainda não havia tecnologia para garantir mais autonomia e recargas mais rápidas.
Alguns fatores de concepção dos modelos também foram pontos fracos da Gurgel. Apesar de não ser o único critério, a beleza do veículo afeta na escolha do consumidor, e alguns modelos deixavam a desejar frente seus concorrentes.
Seja estética ou a tentativa da eletrificação, nada diminui o legado de sonho e, melhor ainda, de fazer acontecer. Esse combustível mudou o Brasil.
A COMPRA E NOVO USO DA MARCA
Em 2004, o empresário paulista Paulo Emílio Freire Lemos adquiriu os direitos da marca Gurgel junto ao INPI. A compra envolveu inclusive o logotipo e, de acordo com a revista Autoesporte, por um valor simbólico: R$ 850,00. A nova Gurgel tem fábricas em Presidente Venceslau/SP e Três Lagoas/MS e produz tratores agrícolas, empilhadeiras a diesel e elétricas.
OUTRO RESSURGIMENTO: OS NOVOS FNM
Outro símbolo da indústria nacional foi a Fábrica Nacional de Motores, a FNM. Essa marca também foi ícone, mas no mercado dos caminhões. Confira mais dessa estória, e o ressurgimento da marca 👇🏻:
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