O primeiro filme brasileiro e a história do cinema nacional

 Arte

 

Já com o Brasil República, tivemos a primeira filmagem em solo nacional, que aconteceria setenta e dois anos depois da primeira foto tirada no mundo. Vamos conhecer, ao longo deste post, muito mais dessa história.

 

Primeira filmagem foi dos irmãos Segreto. Imagem ilustrativa.

[O que a primeira filmagem representava. Imagem: NotiSul | Reprodução]


 

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QUAL TERIA SIDO A PRIMEIRA GRAVAÇÃO BRASILEIRA?

 

O ítalo-brasileiro Afonso Segreto aprendera técnicas de filmagem na França e estava novamente no Brasil. A bordo do navio Brésil, filmou a Baía de Guanabara, Rio de Janeiro, em 19 de junho de 1898. Esse é considerado, hoje, o dia do Cinema Brasileiro.

 

Há versões de que Afonso Segreto, junto com seu irmão Pascoal, teria apresentado publicamente um documentário que eles fizeram, em 5 de novembro de 1896. O tema era a praia de Santa Luzia.

 

Houve outra filmagem que é muito citada: a chegada de um trem na estação de Petrópolis. Sua data teria sido de 1897.

 

Esses filmes teriam sido exibidos na mesma época de uma série de documentários sobre cidades europeias, a partir de 1896. Eles teriam sido o pontapé do cinema nacional, muito próximos à nossa primeira gravação em solo brasileiro.

 

A filmagem da Baía de Guanabara é a considerada, pelos historiadores, como aquela em que se tem mais evidências de ter sido a primeira do Brasil. As gravações estão desaparecidas até hoje, talvez não existam mais, mas há registros na Gazeta de Notícias de 20 de junho de 1898 que confirmam o fato.

 

E DEPOIS DISSO?

 

O cinema nacional cresceu e, como vários outros setores, é bem diferente da forma com que se apresentava em seus anos iniciais no Brasil. Houve filmes premiados internacionalmente, inclusive. Central do Brasil, Tropa de Elite, O Auto da Compadecida e Ainda Estou Aqui são alguns grandes exemplos.  Eles sagraram grandes nomes como Nelson Pereira dos Santos, Arnaldo Jabor, João César Monteiro, Glauber Rocha, Walter Salles e tantos outros.

 

Assim como a Literatura e a memória que vem da imprensa (lembre-se de que sabemos qual o primeiro filme a partir de uma manchete de jornal), o cinema de um país guarda sua cultura e identidade. Além disso, também ajuda a ilustrar os valores de uma dada época, que vão mudando.

 

O mercado brasileiro é bem influenciado por filmes estrangeiros. Claro que o fomento à indústria cinematográfica nacional aumentou e ela cresceu com o passar dos anos. Dados da Ancine apontam dezessete milhões de espectadores no ano de 2017, onde 34 % dos longas-metragens eram nacionais.

 

Após a exibição do filme dos Irmãos Segreto, o mercado exibidor se estruturaria entre 1907 a 1910. A falta de eletricidade dificultava surgirem novas salas de cinema, que tinham equipes próprias de filmagem - quase como na série Cine Holliúdy. Apesar disso, a maior parte dos filmes exibidos era de origem europeia.

 

Grande parte dos primeiros filmes eram documentais. A primeira película de ficção seria de 1908: o curta "Os Estranguladores", de Antônio Leal e Francisco Marzullo. O primeiro longa-metragem, por sua vez, data de 1914, sendo "O Crime dos Banhados", dirigido por Francisco Santos.

 

Os filmes posados eram produções de ficção feitas pelos proprietários das salas de cinema cariocas e paulistas. Havia estórias inspiradas em crimes, reais, comédias, filmes cantados (atores se dublavam por trás da tela) e adaptações de obras literárias.

 

Mais tarde, na Primeira Grande Guerra, a indústria europeia declinou e a estadunidense trouxe filmes isentos de taxas alfandegárias, aos montes. Isso enfraqueceu o cinema nacional naquela época.

 

Nos anos 1930, o primeiro grande estúdio surgiu no Brasil: o Cinédia. Nessa época, surgiram filmes como Ganga Bruta (1933), de Humberto Mauro; A voz do Carnaval (1933), também de Mauro e de Ademar Gonzaga; bem como Limite (1931), de Mário Peixoto.

 

Ainda nesse período, propagou-se no Brasil o cinema sonoro. Um grande título desse formato foi "Acabaram-se os otários" (1929), de Luiz de Barros.

 

Nas décadas de 1930 e 1940, as distribuidoras dos filmes estadunidenses investiram em publicidade e salas de cinema que fossem compatíveis com filmes falados (talkies). O público brasileiro se acostumou a filmes hollywoodianos com início, meio e fim, legendados, com finais felizes.

 

Isso fez com que a Cinédia seguisse esse formato com estórias musicais, românticas e com grandes cenários e estrelas, como Carmen Miranda. Alguns exemplos são "Alô, Alô Carnaval" (1936) e Pureza (1940). Mas a disparidade era gigante: em 1942, um filme brasileiro dentre quatrocentos e nove lançados.

 

Os primeiros longas-metragens brasileiros eram muito inspirados nos estadunidenses. Com diretores estrangeiros, grandes estúdios e equipamentos modernos, em 1949 vieram os estúdios Vera Cruz, marcantes no cinema nacional.

 

Em 1953, a produtora Vera Cruz conseguiria um feito inédito: lançar o primeiro filme brasileiro a ganhar o festival de Cannes. Esse filme foi "O Cangaceiro", de Lima Barreto. Além disso, nesse período, as comédias de Amácio Mazzaropi ficariam dali para a eternidade.

 

Com o surgimento da TV Tupi em 1950, alguns atores deixaram o cinema. Quatro anos mais tarde a Vera Cruz não conseguiria sanar suas dívidas e, com isso, veio à falência. Também em 1954, o primeiro filme nacional em cores: "Destino em Apuros", de Ernesto Remani.

 

Pouco antes, nos anos 1940, despontariam as chanchadas, que são filmes cômicos, musicais e de baixo orçamento. Esse foi um gênero forte da empresa Atlântida Cinematográfica, sediada no RJ e criada nesse período. 

 

Havia uma produção constante de filmes da Atlântida. Um circuito exibidor do grupo de Luiz Severiano Ribeiro garantia espaço para essa produção, que contava com atores como Oscarito, Grande Otelo e Anselmo Duarte.

 

Outro nicho forte da Atlântida foram as comédias musicais de carnaval, como as de Watson Machado: Este Mundo é um Pandeiro (1947) e Carnaval no Fogo (1949). Outro gênero envolvia a comédia de costumes e tipos folclóricos cariocas, como os filmes de Carlos Manga: Matar ou Correr (1954) e Nem Sansão Nem Dalila (1954).

 

 O CINEMA NOVO

 

As chanchadas eram populares, mas muito esculachadas pela crítica especializada. O nome chanchada, inclusive, vinha do espanhol "safadeza". A fórmula foi se desgastando e o público também a abandonou.

 

Movimentos europeus de vanguarda atingiram o Brasil e o cinema nacional foi mudando. Um dos marcos precursores foi o filme Rio, Quarenta Graus (1955) de Nelson Pereira dos Santos.

 

Os novos cineastas não tentavam ser hollywoodianos, mas tinham cunho social e político. No Cinema Novo, Glauber Rocha e seus contemporâneos trabalhavam na estética-da-fome, onde havia obras de baixo orçamento, e isso se transformava em estética.

 

Alguns filmes importantes dirigidos por Glauber, um dos maiores cineastas nacionais, marcam essa época: Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), Terra em Transe (1967) e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro (1968). Outros ícones do Cinema Novo foram Vidas Secas (1963), de Nelson Pereira dos Santos, e Os Fuzis (1964), de Ruy Guerra.

 

Iniciado o regime militar, entre o final dos anos 1960 e início de 1970, cineastas mais radicais adotaram o udigrudi (inspirado no inglês underground, mas aportuguesado). A ideia era fazer algo ainda mais experimental, fugindo das fórmulas prontas. 

 

Assim como a arte literária e plástica falou em movimento antropofágico em 1922, os adeptos do udigrudi reforçaram a chamada estética-do-lixo. Alguns deles foram Rogério Sganzerla (do filme O Bandido da Luz Vermelha) e Júlio Bressane (Matou a família e foi ao cinema).

 

Dentro da ditadura militar, a Empresa Brasileira de Filmes foi criada em 1969, financiando produções alinhadas ao regime. A indústria nacional foi controlada pelo Conselho Nacional de Cinema (Concine), e a atuação desses órgãos, em tese, fomentaria a indústria nacional.

 

 As salas de cinema ficaram mais cheias, estimulando alguns sucessos. Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976) fez mais de dez milhões de espectadores, sendo um longa superado em público apenas por Tropa de Elite 2, de José Padilha, anos mais tarde, em 2010. Os Trapalhões também fizeram bastante sucesso.

 

A Embrafilme impulsionava filmes de viés comercial. Em paralelo, os cineastas da boca-do-lixo fizeram as pornochanchadas - filmes com comédia e muito conteúdo erótico. Eles entravam na reserva de mercado nacional (com cortes pela censura) nos circuitos exibidores.

 

CRISE DOS ANOS 1980 E 1990

 

O setor cinematográfico começou a enfraquecer por vários motivos. A pornochanchada, por exemplo, decaiu frente ao mercado pornográfico de fato (o hardcore). Em todo o resto, foi a batalha entre cinemas e videocassetes.

 

A situação econômica do país fez as pessoas priorizarem suas demandas e deixassem de ir ao cinema. Visando salvar seus lucros, donos de cinemas não queriam ter de cumprir as cotas de filmes nacionais, menos rentáveis.

 

Novos cineastas surgiram. Sérgio Bianchi, Hermano Penna, Sérgio Toledo e André Klotzel, além do cabra-marcado-para-morrer Eduardo Coutinho (cineasta) acabaram mais restritos aos festivais, como o de Gramado, mais importante do país na época.

 

No governo Collor, a Embrafilme, Concine, Ministério da Cultura e outros órgãos foram extintos, além de cortes orçamentários e leis, minguando as produções nacionais. Foram apenas três lançamentos em 1992. Foi nessa época que Arnaldo Jabor, cineasta do Cinema Novo, migrou para a TV na falta de oportunidades no cinema.

 

RETOMADA E NOVOS SUCESSOS

 

Entre 1992 e 2003, houve uma retomada no cinema nacional, estimulada pela Lei do Audiovisual, que partiu da Secretaria para o Desenvolvimento Audiovisual do Governo Itamar Franco. Essa Lei promoveu vários filmes, tais como:

 

× Carlota Joaquina, Princesa do Brazil (1994), primeiro realizado com esse recurso, filme de Carla Camurati.

× O Quatrilho (1995), de Fábio Barreto.

× O Que é Isso, Companheiro? (1997), de Bruno Barreto.

× Central do Brasil (1998), de Walter Salles.

 

Os três últimos citados foram indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro, em 1996, 1998 e 1999. Central do Brasil teve indicação também na categoria de melhor atriz para Fernanda Montenegro. A mãe de Fernanda Torres, indicada ao Oscar mais tarde também, havia sido a primeira latino-americana a concorrer e atuando em português.

 

A estética falando de problemas nacionais (cosmética-da-fome) como a miséria, internacionalizou alguns filmes nacionais, mas não chamou o público para ver esses mesmos filmes nas salas de cinema brasileiras. A dominação das produções estrangeiras é uma constante.

 

A Globo Filmes, por sua vez, é bem-sucedida ao promover seus filmes nacionais, usando franquias que misturam TV e cinema. No ano de 2003, 90 % das receitas do cinema nacional em bilheteria foram de filmes da Globo.

 

Um exemplo de paralelo TV e Cinema foram Cidade dos Homens (série de TV) e Cidade de Deus (2002, filme) de Fernando Meirelles. O filme recebeu o Globo de Ouro de melhor filme e foi indicado a quatro Oscars: melhor diretor, melhor roteiro adaptado, melhor direção de fotografia e melhor edição. Tanto reconhecimento, mesmo sem levar o Oscar ainda, motivaram novos sucessos nacionais.

 

Vieram Carandiru em 2003, de Hector Babenco e Tropa de Elite, 2007, de José Padilha. Esse segundo virou sucesso no DVD pirata e depois estourou nos cinemas com o boca-a-boca gerado por meios tortos.

 

No ano de 2013 foram mais de cento e vinte longas nacionais, muitos com bilheterias acima de um milhão de espectadores. Houve tanto comédias populares como "De Pernas pro Ar" (2010) e "Minha Mãe é uma Peça" (2013), como produções independentes reconhecidas internacionalmente, como as feitas pelos cineastas como:

 

× Kleber Mendonça Filho (Aquarius, O Som Ao Redor);

× Gabriel Mascaro (Ventos de Agosto, Boi Neon);

× Marco Dutra (Trabalhar Cansa, As Boas Maneiras);

× Anna Muylaert (Que Horas Ela Volta?);

× Tata Amaral (Hoje);

× Karim Aïnouz (O Céu de Suely, Praia do Futuro);

× Petra Costa (Elena, O Olmo e a Gaivota);

× Adirley Queirós (Branco Sai, Preto Fica) e 

× Daniel Ribeiro (Hoje Eu Quero Voltar Sozinho).

 

Também em 2013, canais por assinatura, pela Lei 12.485, tiveram de inserir filmes nacionais em horário nobre. Em breve, o Streaming também terá cotas nacionais.

 

De lá para cá, novas crises e políticas como remover o Ministério da Cultura mexeram nas políticas de fomento. O país foi ficando mais dividido politicamente e o setor audiovisual ficou envolvido em toda e qualquer discussão, como outras esferas da vida das pessoas. É tudo muito intenso.

 

Isso ocorre com nosso atual maior sucesso. Ainda Estou Aqui (2024) já teve mais de três milhões e meio de espectadores, é sucesso internacional, e ainda assim envolve torcidas pró e contra dentro do Brasil.

 

MAIORES BILHETERIAS BRASILEIRAS

 

Ainda Estou Aqui é a maior bilheteria de filmes nacionais pós pandemia. Falando em filmes também grandes, com mais de quatro milhões de espectadores, temos:

 

 

Anos 1970

 

× Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976), de Bruno Barreto.

× A Dama do Lotação (1978), de Neville de Almeida.

× O Trapalhão nas Minas do Rei Salomão (1977), de J.B. Tanko.

× Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia (1977), de Hector Babenco.

× Os Trapalhões na Guerra dos Planetas (1978), de Adriano Stuart.

 

Anos 1980

 

× Os Saltimbancos Trapalhões (1981), de J. B. Tanko.

× Os Trapalhões na Serra Pelada (1982), de J. B. Tanko.

 

Anos 1990

 

× Lua de Cristal (1990), de Tizuka Yamasaki.

 

Anos 2000

 

× Se Eu Fosse Você 2 (2009), de Daniel Filho.

× Dois Filhos de Francisco (2005), de Breno Silveira.

× Carandiru (2003), de Hector Babenco.

 

Anos 2010

 

× Os Dez Mandamentos – O Filme (2016), de A. Avancini.

× Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro (2010), de José Padilha.

× Minha Mãe é Uma Peça 2 (2016), de César Rodrigues.

× De Pernas pro Ar 2 (2012), de Roberto Santucci.

× Nosso Lar (2010), de Wagner de Assis.

 

Anos 2020

 

Em função da pandemia, tudo arrefeceu. Ainda Estou Aqui (2024) deve ultrapassar os quatro milhões de espectadores também, e novos sucessos surgirem.

 

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