Leia o terceiro e o quarto capítulos de uma
série de cartas que compõem um conto de Machado de Assis, o maior escritor
brasileiro de todos os tempos, fundador da Academia Brasileira de Letras. Este
conto faz parte da coletânea ‘Histórias da Meia Noite’.
“TERCEIRO CAPÍTULO
À
MESMA
Corte, 17 de outubro
Escrevi-lhe anteontem uma carta, e
acrescento hoje um bilhetinho (sem exemplo) para dizer que o velho noivo da
Mariquinhas inspirou paixão a outra moça, que adoeceu de desespero. É uma
história complicada. Compreende isto? Se fosse o filho vá; mas o pai!
RAQUEL”
“QUARTO CAPÍTULO
À
MESMA
Corte, 30 de outubro
Muito velhaca é você. Então porque lhe
falei duas ou três vezes no rapaz, imagina logo que estou apaixonada por ele?
Papai nestes casos costuma dizer que é falta da lógica. Eu digo que é falta de
amizade.
E provo.
Pois se eu tivesse algum namoro, afeição
ou coisa assim, a quem diria em primeiro lugar senão a você? Não fomos durante
tanto tempo confidentes uma da outra? Supor-me tão reservada é não me ter
amizade nenhuma, porque a falta de afeição é que traz a injustiça.
Não, Luísa, eu nada sinto por esse moço, a
quem conheço de poucos dias. Falei nele algumas vezes por comparação com o pai;
se eu estivesse disposta a casar-me, certamente que preferia o moço ao velho.
Mas é só isto e nada mais.
Nem imagine que o Dr. Alberto (é o nome
dele) vale muito; é bonito e elegante, mas tem ar pretensioso e parece-me um
espírito curto. Você sabe como eu sou exigente nesses assuntos. Se eu não achar
marido como imagino, fico solteira toda a minha vida. Antes isso, que ficar
presa a um cepo, ainda que esbelto.
Também não basta ter os predicados que eu
imagino para me seduzir logo. Anda agora aqui em casa um sujeito que nos foi
apresentado há pouco tempo; qualquer outra moça ficava presa pelas maneiras
dele; a mim não me faz a menor impressão.
E por quê?
A razão é simples; toda a graça que ele ostenta,
toda a afeição que simula, todos os cortejos que me faz, quer saber o que é,
Luísa? é que eu sou rica. Descanse; quando me aparecer aquele que o céu me
destina, você será a primeira a ter notícia. Por ora estou livre, como as
andorinhas que estão agora a passear na chácara.
E para vingar-me da calúnia, não escrevo
mais. Adeus.
RAQUEL”
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