Foi a bendita fila


Esperar é um dom divino de sabedoria e um ato de civilidade. Filosófico, não? Intangível? Às vezes, parece. Vivemos em um tempo em que justo ele, o tempo, parece ser uma noção complexa, pois se trata de algo que não se pode acumular, mas que precisamos, em algum momento, que sobre, para que possamos gastá-lo em algo prazeroso. Filas extensas e demoradas, atendimentos que levam horas, congestionamentos, preguiça aparente diante da nossa pressa fazem com que os nervos saiam à flor da pele.
Nem todos estes empecilhos são fáceis de evitar. Certo dia fui ao supermercado comprar rodelas de pizza, queijo, presunto, salaminho, azeitonas, hummmm... Sinto água na boca só de pensar nas pizzas que fizemos lá em casa. Voltando das sensações gastronômicas, antes de comê-las, passara por uma fila enorme para ter acesso ao check-out (dizer caixa é algo muito estranho, quase um estrangeirismo) e lembrara do detalhe de que esqueci das azeitonas. Eu e minha mulher estávamos sozinhos e deixamos o carro na fila e fomos buscar o que faltara. Quando retornamos, havia uma pessoa a mais na fila, em nossa frente. Fazia quarenta minutos que esperávamos e não esperaríamos mais um casal. Avançamos com o carro, sinalizando, e nada... até que me projetei à frente do casal que nos logrou, indicando a real situação das coisas. Começou o bate-boca, ninguém mais tinha razão neste momento. Eu, como homem, queria ir até as últimas consequências; minha esposa, como mulher, deixou que eles passassem.
Pouco antes, um casal de velhinhos, adivinhem, orientais, nos disseram que o tempo que gastamos discutindo era suficiente para que nós todos pagássemos nossas contas. Neste momento, ouvimos as vozes da sabedoria e decidimos segui-las. Não dou mais um boi para não sair de uma briga, faço um churrasco! Ou uma pizza talvez... Foi a bendita fila. 

SANTIAGO, Bento. 

Veja também: (Literatura) Agradando a gregos e troianos

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