Como se chegou ao que hoje conhecemos como ciclo hidrológico?

História

Como nada se cria e todos os elementos químicos e as substâncias por eles formadas passam por transformações e ciclos repetidos milhares e milhares de vezes em nosso meio natural, esta ideia não surgiu do nada. Porém, as primeiras noções de ciclo hidrológico eram completamente equivocadas por conta, também, da forma como o conhecimento era produzido à época dos filósofos gregos, como Homero, Tales de Mileto e Aristóteles, que formularam inúmeras teorias para explicar de onde surgia a água que circulava desde as pequenas sangas até os rios mais profundos.

Muito do que se observava no meio natural, além de algumas hipóteses, eram usados para definir as primeiras noções do ciclo hidrológico. Quem já foi a uma praia, e observou que a linha do horizonte parece estar em um nível mais alto do que a própria praia, teve a impressão de que ‘além do horizonte existe um lugar...’ mais alto ... do qual a água poderia infiltrar por cavernas subterrâneas e, sendo este lugar mais alto do que as mais altas montanhas, e com comunicação destas cavernas com o topo destas montanhas, ficaria fácil explicar o nascer de rios em locais altos. Mas o principal equívoco estava no fato de que os filósofos não acreditavam na relação entre a água das chuvas e o abastecimento dos rios, que é o ponto-chave do ciclo hidrológico. 

(águas passeiam pela Terra)
[Imagem: SAAE Macaúbas]


A salinidade das águas oceânicas, em contraponto às águas doces dos rios e lagos, ocorreria por conta de sucções subterrâneas (assim, somente a água percolaria o solo em busca das cavernas subterrâneas). Pressões provocadas pelos ventos também auxiliariam neste fenômeno.

Aristóteles (384 – 322 a.C) foi aluno de Platão e um dos maiores filósofos naturais da Era Antiga, responsável pela maior publicação envolvendo fenômenos meteorológicos: a Meteorológica – os três primeiros volumes envolvem formação de nuvens, chuva e neblina, ventos, mudanças climáticas, incidência de raios (e suas partes: trovão (som) e relâmpago (luz), da qual ele já passou a assumir que havia ligação).

Duas bases orientaram os argumentos de Aristóteles em sua obra:

- O Universo teria forma esférica, sendo que seus componentes seriam esferas concêntricas que possuem movimento relativo entre elas, sendo a Terra a esfera central, conforme já havia enunciado Eudoxus. O movimento aparente dos corpos celestes seria causado por este movimento combinado;
- As esferas concêntricas seriam compostas pelos 4 elementos: Terra, Água, Ar e Fogo, segundo já havia anunciado Empédocles.

Aristóteles afirmava que havia as esferas de ar e fogo na Atmosfera, sendo que o ar contido acima das mais altas montanhas continha fogo e, portanto, não ocorreria a formação de nuvens nesta subcamada. A subcamada da camada de ar inferior é que abrigaria a formação de nuvens.

Na Meteorológica, Aristóteles apresentava as teorias até então existentes, indicava por que as considerava erradas em parcialidade ou totalmente, logo após indicando qual seria a sua explicação para determinado assunto.  Os filósofos naturais anteriores a Aristóteles, como Anaxágoras, partiam de raciocínios mais indutivos, ou seja, a generalização de um dado fenômeno diante de algumas ocorrências, enquanto Aristóteles tendia ao raciocínio dedutivo, ou seja, com base em fatos já consolidados, ele construía um raciocínio e, se todos estes fatos estivessem corretos, o resultado deles estaria correto. Suas teorias sobre os fenômenos meteorológicos eram explicadas pelas exalações úmida e seca, ambas presentes no ar e em proporções não fixas. 

Aristóteles, assim como outros filósofos naturais, deixava de lado evidências experimentais e, por isso, a Meteorológica e muitas obras que se sucederam, baseando-se nela e acrescentando alguns pontos de vista, eram repletas de erros sobre o assunto. Poucos foram os progressos na área da Meteorologia nos 2000 anos que se passaram após a publicação dessa série de livros.

O matemático e geógrafo Eratóstenes (conhecido pelo crivo de números primos, ver links sugeridos) chegou à conclusão de que as cheias no Rio Nilo eram decorrentes de fortes chuvas em suas nascentes, o que foi uma conclusão certa durante este período. Com a dominação da nação grega pelo Império Romano, houve uma queda na produção de conhecimento (os romanos dedicavam-se mais às questões práticas), mas eles tiveram o cuidado de preservar a produção de conteúdo das épocas anteriores. Pior ainda quando o Império Romano teve seu fim, quando as poucas obras que surgiram foram releituras de trabalhos antigos, na sua maioria feitas por membros do clero.

O avanço dos árabes muçulmanos serviu para trazer este material já existente e traduzi-lo para o árabe, sendo todo este conhecimento repassado para o Latim mais adiante. Também houve cientistas notáveis entre o mundo árabe, como Ibn Al-Heitham, que chegou à primeira definição correta do crepúsculo.

Roger Bacon (1224-1292) introduziu a experimentação e a aproximação matemática em seus estudos científicos, nos quais incluiu a Meteorologia. Porém, o maior nome nesta ciência, que verdadeiramente fortificou a pesquisa científica, foi René Descartes, criador do sistema de coordenadas cartesianas e do método científico propriamente dito. Em sua obra Discours de la Methóde, os pontos principais foram apontados:

- Nada deve ser dado como verdadeiro até que seja absolutamente certo;
- O assunto deve ter sua complexidade reduzida inicialmente, com a sua divisão em pequenas partes;
- Sempre se deve ir do simples para o complexo na resolução, buscando a relação de uma pequena parte com as demais;
- As investigações científicas devem ser completas e cuidadosas, com uma avaliação adequada de resultados.

Mais adiante, a Meteorologia deixou de ser assunto com base em julgamentos e pontos de vista pessoais, e assumiu uma base matemática mais sofisticada, adotando o método científico em sua estrutura e integrando o ramo da Física Aplicada. Com o avanço nesta nova etapa, chegou-se a real forma em que se estrutura o Ciclo Hidrológico, que pode ser dividido nas seguintes fases:

1) Evapotranspiração;
2) Precipitação;
3) Retenção superficial, por intercepção vegetal (água nem chega a atingir o solo) e por acumulação nas zonas de mais baixo relevo;
4) Detenção superficial;
5) Escoamento superficial ou subsuperficial;
6) Infiltração;
7) Percolação em lençóis aquíferos;
8) Condensação.

Estas fases ocorrem de maneira simultânea e não necessariamente igual em proporções, sendo movidas diretamente por meio de energia advinda da luz solar. Porém é mantido certo equilíbrio, já que o nível médio dos mares se mantém em valores semelhantes ao longo do tempo.

A água oceânica evapora, sendo transportada aos continentes pelo movimento das massas de ar. Ocorrendo o resfriamento até o ponto de orvalho, o vapor se condensa e forma nuvens ou neblina. Esse resfriamento ocorre já na ascensão do vapor onde, com o decréscimo de pressão, ocorre um decréscimo de temperatura. Em condições meteorológicas especiais, as gotas de vapor condensado unem-se e caem na forma de precipitação.

Na faixa de dois terços da água que cai por precipitação, o retorno ao ciclo hidrológico ocorre na evaporação das superfícies de água, no solo e na vegetação (transpiração). O outro um terço irá retornar ao ciclo quando retornar aos oceanos, por caminhos superficiais, subsuperficiais e subterrâneos, contando também com a ação da gravidade (que influi de maneira diferente da que se pensava na formulação grega, ao invés de ir do oceano às montanhas, ocorre o oposto).


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