Veja esta crônica escrita por Paulo Sant’Ana
para o Jornal Zero Hora de Porto Alegre, em outubro de 2011, falando sobre a
facilidade de crédito nos dias atuais.
“O meu instrutor de ginástica, Paulo
Toldo, costuma dizer: “Comprar é uma coisa, pagar é outra bem diferente”. E tem
razão. Todas as coisas com valor que adquiri, se eu fosse sensato, não deveria
adquiri-las. Era quase certo que não poderia pagá-las, mas enfrentei o crédito
e acabaram sendo minhas.
Em suma, para se comprar um bem caro, é
necessário que se tenha receio de não poder pagá-lo.
O crédito é esta fenomenal invenção humana
mediante a qual se pode adquirir alguma coisa antes mesmo de merecê-la, isto é,
depois de adquirido o bem, é que você vai se esforçar para pagá-lo. Eu não
poderia ter adquirido, há 30 anos, minha primeira casa própria, se não fosse em
240 prestações mensais, pelo então existente Banco Nacional de Habitação. E,
depois de 20 anos, eu não estava só na posse mas também na propriedade do meu
apartamento.
Não conheço ninguém próspero que não tenha
usado o crédito para ficar rico. Todos os ricos compraram seus bens e empresas
a crédito. Podem até os ricos comprar tudo à vista agora que estão ricos, mas
só ficaram ricos porque compraram tudo a crédito.
Então, sob certo aspecto, quando se vai
adquirir alguma coisa de valor, deve-se pensar assim: “Em realidade, eu não poderia
adquirir isso, mas vou fazê-lo, com o tempo eu haverei de dar um jeito de pagar”.
Esse truque vem a ser exatamente a impetuosidade exigida em todo negócio, que
implica risco e coragem. Eu vou além, se eu fosse impetuoso e corajoso nos
negócios, tenho certeza de que seria rico. Só não o sou porque meus receios,
minha mania de fazer tudo com os pés no chão, não me deixaram comprar a crédito
tudo o que deveria ter comprado. Vai daí que para se prosperar não se tem de
ter os pés no chão, tem de se ter a cabeça no sonho.
Conheci muita gente que ficou rica tendo o
seguinte comportamento: comprava tudo o que podia a crédito, não interessava
nem o preço, podia ser exagerado. Mas comprava. E foi se locupetando. É também
verdade que conheci muita gente que saiu a comprar tudo a crédito e depois não
pôde pagar e foi à falência. Mas eu não estou aqui me fixando nos que se deram
mal ao comprar a crédito. Eu estou aqui afirmando que todos que se deram bem
foi porque compraram a crédito.
Quantos milhões de pessoas não poderiam
ter adquirido seus refrigeradores, televisores, carros, se não fosse pelo
crediário? Ou seja, o crédito transforma a vida para melhor, além de ser fator
impulsionador de progresso das pessoas, creio que também das nações. Comprar é
uma coisa, pagar é outra bem diferente. E, depois que criaram esse tal de
cartão de crédito, as pessoas não compram mais à vista coisa nenhuma, nem o
cigarro, nem o jornal, talvez só a engraxada no sapato.”
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