A Guerra do Paraguai foi um episódio
histórico que ilustra bem quando um concorrente usa de artimanhas para derrubar
outro. Foi isso que aconteceu com a Inglaterra em relação ao Paraguai, no
século XIX. Buscando eliminar o possível concorrente de mercado em produtos industrializados,
o pioneiro fabril acendeu uma rixa entre os vizinhos Argentina, Uruguai e
Brasil com o país vizinho, que saiu arrasado.
Vários países da América Espanhola, muitos
que recém haviam deixado de ser colônias, estavam
em situação econômica complicada e, apesar da independência, continuaram com
uma economia basicamente agrícola e, pior ainda, com grande concentração de
terra. Já no Paraguai, o caminho parecia ser outro: nos governos de José
Francia (1811 – 1840), Carlos Lopez (1840 – 1862) e, após, no governo de Solano
Lopez, problemas como o analfabetismo e a má distribuição de terras foram
praticamente erradicados, com um política forte de reforma agrária e
fornecimento de insumos para fortalecer o setor agrário, o que melhorou em
muito o abastecimento de alimentos dentro do país. No governo destes dois primeiros,
o setor industrial passou a se desenvolver, no mesmo embalo.
Todavia, a posição geográfica do Paraguai
não é privilegiada, sem saídas para algum oceano, o que dificultaria ambições
futuras de exportações. A rota usual por navegação era a região da bacia do
Prata, que passa pelos territórios do Uruguai, Brasil e Argentina. Alguns
historiadores afirmam que o Paraguai estruturou seu exército e buscaria uma
intervenção militar em busca da conquista de sua saída para o oceano.
Vendo que o concorrente estava crescendo,
segundo outra corrente histórica, a Inglaterra preocupou-se em acabar com os
planos de crescimento de um potencial concorrente, cujo modelo poderia se
estender por toda a América Latina. Com isso, buscou os governos do Brasil e da
Argentina, estimulando-os a lutar contra o Paraguai e dispondo-se a fornecer
recursos para tanto. Em maior ou menor escala, o massacre de concorrentes
comerciais sempre existiu, onde os grandes de algum setor adotavam medidas nem
sempre canônicas. Uma delas é adotar preços baixos a ponto de levar o
concorrente à falência. Outra, como no contexto não havia maiores concorrentes,
é inibir o adversário por meio do uso do jogo político, como fez o governo inglês.
E mais: ainda lucrou com os empréstimos oferecidos aos países da Tríplice
Aliança, da qual falaremos mais tarde.
Nesta época, surgiu uma corrente na
política uruguaia que defendia a criação de um país cujo território seria o do
antigo Vice-Reinado da Prata, o que foi reprimido rapidamente por intervenção
do governo brasileiro. Finda a ideia, o governo inglês seguiu as discussões até
que Brasil, Uruguai e Argentina, no ano de 1865, formaram a chamada Tríplice
Aliança e uniram seus exércitos contra o Paraguai.
No início, o exército paraguaio, com boa
qualidade técnica e portando muitos homens, obteve algumas vitórias. Mas, em
três contra um, só poderia dar surra, desleal e infelizmente. O Paraguai saiu
arrasado, após cinco anos de lutas até a capitulação (rendição). A estrutura
industrial ficou arrasada, bem como as zonas agrícolas. Como qualquer país após
uma guerra de longa duração, a maioria da população de homens, jovens e adultos,
foi dizimada, o que costuma dificultar o processo de reconstrução de um país.
Homens de várias partes do Brasil fizeram
parte do exército que lutou ao lado da Tríplice Aliança, entre eles os gaúchos.
Como o sul de nosso país possua constantes problemas com as fronteiras, sempre
era necessário que os estancieiros intervissem na guarda do território com seus
próprios homens. Com o desgaste promovido pelas constantes lutas, e a falta de
apoio técnico e de pessoal pelo governo central, ocorreram a revolução
Farroupilha e a Guerra dos Farrapos de 1835 a 1845. Entretanto, mais tarde, na
Guerra do Paraguai, lá estavam os gaúchos novamente a lutar pelo exército brasileiro.
O Paraguai, por sua vez, nunca mais voltou
a demonstrar sua posição de destaque de outrora. De país em ascensão industrial
passou a ser, atualmente, conhecido por sua tradição como revendedor de artigos
industriais produzidos principalmente pela indústria chinesa. Infelizmente, um
dos produtos que são fortemente manufaturados em solo paraguaio são os
cigarros, onde a maioria da produção é destinada aos países estrangeiros. Para
se ter uma ideia, um terço do consumo brasileiro de cigarros é suprido pelas
fábricas paraguaias. Curiosamente, o proprietário da maior fabricante de
cigarros no país é também o atual presidente, Horácio Cartes.
Segundo dados de 2009, em coluna escrita
por Frei Betto, acredite: os novos desafios para o país são desenvolver seu
setor industrial e realizar uma reforma política e agrária. Em 2009, o PIB
paraguaio era de cerca de quatorze bilhões de dólares e a inflação de 10,3%. De
país modelo, hoje o Paraguai enfrenta os mesmos desafios de dois séculos atrás,
devido ao recesso provocado pelo massacre de Guerra. As dificuldades econômicas
fazem com que o país seja pouco atrativo para os jovens que, por muitas vezes,
acabam vindo ao Brasil em busca de uma vida melhor, em número estimado de meio
milhão de jovens.
Então, se hoje vemos este panorama
econômico-político-social no Paraguai, ele é fruto de todos os rumos históricos
aos quais o país foi submetido. Muitas vezes, até mesmo para entender as
características de nosso país no momento atual, é preciso analisar o que
ocorreu até ali para tal. No Brasil, o processo de industrialização foi mais
tardio. Caso ocorresse à mesma época, o país arrasado poderia ter sido o nosso.
Não foi uma questão específica, mas um contexto, em que apenas um país pioneiro
industrialmente massacrou seu adversário, sem sujar suas mãos.
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