O Enem, transformado em grandioso processo
seletivo, baliza e norteia todo o ensino da Educação Básica. Tornou-se a
locomotiva, e os vagões são as séries do Ensino Médio e do Ensino Fundamental.
Questionamentos há, mas o fato de o MEC ser o timoneiro dos conteúdos a serem ministrados
permite a implementação de uma política educacional para todo o território
brasileiro. Havia significativas
disparidades entre os programas dos vestibulares, por exemplo, da USP, UFRJ,
UFSC, UnB, ITA, etc. Até mesmo no Paraná, um grande número de alunos que
lograva êxito na UFPR reprovava no
Cefet, UEL, UEM, pelas diferenças de conteúdos, critérios e pesos.
Recordemos que são muitos os países que
adotam provas e currículos unificados para o ingresso em suas universidades. O
destaque é o SAT (Scholastic Assessment Test), o vestibular norte-americano ao
qual o Enem pretendeu se modelar. Estamos caminhando na direção certa e é
“caminhando que se constrói um novo caminho”.
As duas últimas edições foram de
trapalhadas, por motivos torpes, desonestidade dos fraudadores e/ou incúria da
gestão pública: em 2009, vazamento e anulação da prova, acarretando um prejuízo
de R$ 165 milhões; em 2010, falhas na encadernação da prova amarela e troca de
cabeçalho no cartão resposta levaram parte dos alunos a refazer o exame. Em
2011, o Inep contratou por R$ 5 milhões uma empresa de gestão de risco, para
monitorar toda a logística, da impressão à aplicação das provas. Outro
aprimoramento, em 2012, serão duas edições: a primeira nos dias 28 e 29 de
abril e a segunda em outubro ou novembro.
Há, pontualmente, ajustes que merecem uma
análise mais aprofundada por parte do MEC, ouvindo-se educadores experientes:
1 - O conteúdo
programático do Enem é excessivo e merece ser mais bem descrito e enxuto. Ficou
genérico demais. A grade curricular deve ser reduzida em 20% a 30%,
eliminando-se subitens de todos os capítulos. Amiúde, debatemos com professores
das diversas disciplinas os quais são unânimes em afirmar que há sobrecarga de
conteúdos. Um detalhamento mais primoroso do programa do Enem evita que o
professor ministre temas complexos e desmotivantes, que não servem de
pré-requisitos e que normalmente serão reapresentados na faculdade.
2- Enunciados
desnecessariamente longuíssimos, quando o candidato dispõe de apenas três
minutos, em média, para a resolução de cada questão.
3- Muito se avançou, porém
em Matemática ainda há excesso de contextualização e aritmética, prescindindo-se
de conteúdos mais profundos e raciocínio lógico. Não ignoramos que a Matemática
tenha escopo prático e utilitarista. No entanto, mundialmente se valorizam seus
bons fundamentos teóricos.
4 - O custo de toda a
logística e aplicação do Enem quase triplicou de 2010 para 2011: subiu de R$
128,5 para R$ 372,5 milhões. Um despautério que merece explicação, considerando
que o número de candidatos teve um incremento de apenas 15%: de 4,6 para 5,3
milhões.
5 - No ranking do
desempenho de quase 20 mil escolas, há peso excessivo à redação, em detrimento
das demais disciplinas. As 180 questões objetivas de todas as matérias valem
apenas 50%. Na outra metade, reina absoluta a redação (de 30 linhas). Ademais,
a correção da redação tem caráter subjetivo. Uma sugestão é que as quatro
provas valham 20% cada uma e também à redação se atribua 20%.
O Inep tem o nobre dever de demonstrar
eficiência em suas ações e resgatar a credibilidade perante os meios acadêmicos
e principalmente perante os 5,3 milhões de inscritos. A sociedade brasileira ─
especialmente os jovens com pouca voz e pouca vez ─
não merece essa quebra de expectativa, o que leva à frustração, descrença e
desesperança. No ano em que a Rainha Elizabeth II passou pelo calvário de
graves problemas familiares, ela cunhou uma expressão que se ajusta ao Enem
2009 e 2010: annus horribilis. □
VENTURI, Jacir J.
(vice-presidente
do SINEPE/PR, diretor de escola e foi professor da UFPR, da PUCPR, de cursos
pré-vestibulares e de escolas públicas e privadas)
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