Morte e Vida Severina (XVII)


[cliptomania] 

FALAM OS VIZINHOS, AMIGOS, PESSOAS QUE VIERAM COM PRESENTES, ETC. 

— De sua formosura
já venho dizer:
é um menino magro,
de muito peso não é,
mas tem o peso de homem,
de obra de ventre de mulher. 

— De sua formosura
deixai-me que diga:
é uma criança pálida,
é uma criança franzina,
mas tem a marca de homem,
marca de humana oficina. 

— Sua formosura
deixai-me que cante:
é um menino guenzo
como todos os desses mangues,
mas a máquina de homem
já bate nele, incessante. 

— Sua formosura
eis aqui descrita:
é uma criança pequena,
enclenque e setemesinha,
mas as mãos que criam coisas
nas suas já se adivinha.
 
— De sua formosura
deixai-me que diga:
é belo como o coqueiro
que vence a areia marinha. 

— De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como o avelós
contra o Agreste de cinza. 

— De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como a palmatória
na caatinga sem saliva. 

— De sua formosura
deixai-me que diga:
é tão belo como um sim
numa sala negativa. 

— é tão belo como a soca
que o canavial multiplica.

— Belo porque é uma porta
abrindo-se em mais saídas. 

— Belo como a última onda
que o fim do mar sempre adia. 

— é tão belo como as ondas
em sua adição infinita. 

— Belo porque tem do novo
a surpresa e a alegria. 

— Belo como a coisa nova
na prateleira até então vazia. 

— Como qualquer coisa nova
inaugurando o seu dia. 

— Ou como o caderno novo
quando a gente o principia. 

— E belo porque o novo
todo o velho contagia. 

— Belo porque corrompe
com sangue novo a anemia. 

— Infecciona a miséria
com vida nova e sadia. 

— Com oásis, o deserto,
com ventos, a calmaria. 

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